O Jeito Luiz Neves de Fazer História

Nessa busca incessante por material sobre a história de Pesqueira descobri os mais diversos tesouros, de todos os tipos. Há aqueles livros consagrados, que todo mundo fala, comenta, indispensáveis para qualquer um que queira se inteirar do assunto. Talvez os maiores exemplos destas obras sejam Pesqueira e o Antigo Termo de Cimbres, de seu Cazuzinha Maciel, e Ararobá, Lendária e Eterna, do Dr. Luis Wilson. De fato são dois livros dos quais não se pode abrir mão quando o assunto for a história local.
Foto: Pequeira Notícias
Os historiadores, mesmo os que historiam apenas por amor à terra, como é o caso dos dois mestres citados, se apegam demais a documentos e outras fontes formais, o que é natural e evidentemente necessário. Então se tem um texto sério, apurado, confiável, de qualidade histórica verdadeira. Mas ainda há aquele escritor que “brinca” de escrever, que observa os arredores, o que se passa nos bares, nas feiras, nas calçadas. Para alguns, a experiência de ler um texto como esse é como viajar no tempo e parar numa época não vivida, tamanha a vivacidade da história contada. Parece que era a gente que estava ali escorado na parede da venda enquanto um “seu Zé” qualquer entrava para comprar uma garrafa de cajuína ou um pacote de mata-fome. Dá aquela sensação gostosa de ver pela janela de casa as pessoas passando na rua, se cumprimentando com um “boa tarde” enquanto o Sol se prepara para descer em repouso depois de iluminar o dia. Esse é o sentimento que tive quando conheci a obra de Luiz Neves. 
Meu primeiro contato com suas crônicas foi com Pesqueira – Evocação Ano 100, que comprei assim, sem querer, e não consegui parar de ler até alcançar a última linha da última página. A parte sobre os tipos populares é particularmente impressionante, um trabalho sem par, carregado de extrema honestidade para com os personagens que trata. Estes são na verdade pessoas reais, cidadãos de uma Pesqueira de outrora, que o tempo, cruel como só ele, tem insistido  em querer apagar. Mas Luiz Neves, generoso conosco, conseguiu guardar um precioso pedacinho deles ali, dentro daquelas cento e tantas páginas. E eles estão sempre disponíveis a visitas, quantas vezes a gente quiser, basta abrir o livro em um dos capítulos onde eles “vivem”. É tudo muito real: o modo de vida, o jeito de falar, de se comportar. É um registro sem máscaras, sem mistérios ou adereços, que mostra o povo do jeito que o povo é.
Ele era um contista e tanto e muitas de suas crônicas são assim vestidas. Elas provocam emoções de todos os tipos. Entre outras, nós rimos além da conta com a história de Estambo de Arubú, que “escapou fedendo” de um de seus pitorescos trabalhos e nos surpreendemos demais com o fenomenal Maro Doido e suas “contanças” nas ruas de Pesqueira. Isso sem falar no episódio comovente de seu desaparecimento na tentativa de lutar pelo País na 2ª Grande Guerra. Só lendo para entender o que estou falando. São histórias tão bem contadas que conseguimos montar em nossas mentes seus cenários com facilidade. Elas fluem tão naturalmente que nos levam de volta a caminhar pelas ruas de terra da cidade, hoje desaparecidas, cobertas pelo asfalto da modernidade.
Nesta obra há ainda sua frase genial, a frase por qual eu vinha procurando desde o começo da minha existência como pesqueirista, a frase que me causa inveja por não ter tido a sensibilidade suficiente para criar: “Na realidade, Pesqueira é, numa síntese, o meu verdadeiro Brasil!”. 
Ainda achando pouco, ele deixa como presente para as futuras gerações, para os que estarão comemorando os duzentos anos de Pesqueira, uma carta tão emocionada que duvido que os olhos de um verdadeiro pesqueirense não queiram se banhar em lágrimas. 
Luiz Neves teve para Pesqueira uma importância impossível de ser descrita nestas tão poucas linhas, e não só no campo da Literatura,  já que foi também um respeitado homem da política. Mas reverencio sua memória neste momento especialmente em nome de pessoas simples que nenhum outro escritor parou para enxergar e dar a merecida importância. Ele foi um dos poucos a perceber que a história não é feita só de nobreza, de títulos e patentes. Graças a ele, homens sem nome se tornaram imortais.
Oliveira do Nascimento.
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Este artigo pertence ao Pesqueira Histórica.